quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Lendo esse 'escancarar as portas', algo antigo saltou na cachola, principalmente considerando o poema de trás pra frente, os dois últimos versos, então lá vai:





DESNUDAMENTO DAS MUDAS QUE SE TIRAM NA PROXIMIDADE ENTRE RAÍZES E CAULE


Entrar na sala assim de repente

na intimidade das coisas que estão

plenas de reservas de silêncios

dos movimentos que se passaram

e daqueles azuis represados

das espontâneas historicidades

sim, visitadas, e não, nunca

que pena! não existidas no plano aberto

Repousa na mesinha de centro

um único mobiliário não identificado

pelos olhos não mais míopes mas

neste relance do tempo-uva afogados

molhados em demasia, ou

vai ver que na medida que tinha que ser

sim, eu também choro na alegria

Na alegria triste da solidez do tic-sem-tac

ouve-se só metade da vida a andar...


Ela, a vida, bem que podia ensaiar uns passos

A vida bem que podia dançar flamenco

ou um sambinha amolecido por chocalhos

e ela pode, mas parece que não quer agora

Parou, quieta, de uma respiração curtinha

Tics tics tics tics tics, pra não incomodar

não quer ocupar o espaço todo, ou queria

Na verdade queria sim, mas nem tudo se consolidou

Ela queria contar histórias que nem foram todas

Ela queria ter vivido um pouco mais longo, o tecido

Queria ter dado um grito calmo na altura e na intensidade

pra sobrar depois a pouca tempestade dos dedos

dois deles só, girando gelos no copo

Ter luzes sobre o objeto na mesinha de centro!

Então foi pelo tato, mas a aspereza nunca é fácil

mas dá um prazer sentir...


Venta sobre as personagens e sobre o copo de chá

Esfria o nariz vermelho, venta esses ventos de querer voar

Voa-se no interior oco e confortável das caixas pequenas

Voa-se por debaixo das costelas, em segredo...

Em segredo até que uns olhos poucos revelem

Veja! Está voando! Com as garrinhas fincadas... aí sim...

Querendo dizer do todo, veja o que faz uma sala vazia:

os voláteis decupam todo o espaço em vida plena!

E agora dá até para sentir uma alegria pelos colares

sem fechos, inacabados, com os fios longos ainda,

as peças por procurar. Pois que os espaços fiquem

em branco assim desse jeito, a história se conta

por si só, divisa-se o objeto no centro da mesa e,

por intranquilo que seja, não se sabe o que é de fato,

pois que seja, pois que apenas seja e,

sabendo-se que é, sabe-se que sempre foi e noutro dia,

virá a ser. Recupera-se o tic-tac, sempre existido.

E o intranquilo objeto repousa, a sala vazia

na relatividade do vazio apenas e é só.

As histórias... de querer, acontecidas então

Na relatividade do todo que voa e sabe voar.


Agora dá até para sentir uma alegria e a vontade
Eu, que ia embora, até vou mesmo

E também vou ficar

A porta estava aberta

A chave estava lá

Um comentário: